(Re)programando a história: O impacto de iniciativas universitárias no empoderamento e inclusão feminina no setor tecnológico
- Soluções em Foco

- 12 de nov. de 2024
- 17 min de leitura
Atualizado: 16 de nov. de 2024
#Include<girls>, uma solução para ampliar a participação de mulheres na tecnologia através do ensino de programação
Por Dieny Fernandes, Joyce Rocha e Sofia dos Reis

Colagem: Sofia dos Reis | Imagens: Pexels
A participação feminina nas áreas tecnológicas cresce cada vez mais ao longo dos anos. Entretanto, a atuação desse público no setor ainda é escassa, devido à reprodução de diversos estereótipos que permeiam a sociedade contemporânea. Diante desse panorama, encontram-se diversos projetos, os quais buscam solucionar essa questão, um deles é o grupo “#Include<girls>”, desenvolvido pela Faculdade de Computação da Universidade Federal de Uberlândia (FACOM/UFU).
De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2023, cerca de 43 milhões de mulheres estavam ativas no mercado de trabalho, mas nem sempre foi assim. Durante a Idade Média, a maioria das mulheres vivia no campo, e por isso, suas atividades estavam ligadas à agricultura, ao cuidado da casa e à criação dos filhos. A produção cultural era dominada pelo gênero masculino até o início da Idade Moderna. "Não é que as mulheres não tivessem trabalho ou não pudessem ocupar funções fora de casa. Elas podiam estar presentes na literatura e nas artes, mas suas atividades eram frequentemente desvalorizadas, invalidadas e tinham sua escrita subjugada, as quais muitas vezes eram apropriadas por figuras masculinas”, explicou Leandra Guerin, professora de Sociologia no Ensino Médio em Uberlândia, MG. As mulheres que moravam nas cidades podiam ter um ofício, ter suas lojas e oficinas de artesanato, desde que seus maridos dessem permissão e sempre em menor número, sem o mesmo prestígio social em relação aos homens. Nesse período, também participavam socialmente por meio da atribuição de seus trabalhos às instituições religiosas, sendo freiras e dedicando suas vidas à caridade e à vida comunitária.
Foi apenas com a ascensão do capitalismo e o começo da revolução industrial, ao fim do século XVIII e início do XIX, que a participação profissional desse público se efetivou. Com o surgimento das fábricas, as linhas de produção passaram a exigir maior quantidade de mão de obra, o que levou à contratação de mulheres e crianças, principalmente em áreas que estavam ligadas à indústria têxtil, em serviços de tecelagem e fiação. Além de trabalhos relacionados ao vestuário, elas estavam presentes em trabalhos de cuidado, como empregadas domésticas, babás e governantas, devido ao crescimento da burguesia, que passou a demandar esses serviços. A área educacional exigia maior qualificação técnica e, por falta de profissionais com tais requisitos, as mulheres começaram a atuar na educação primária.
A professora de sociologia também ressaltou que a demora na introdução da mulher no mercado de trabalho está relacionada aos estereótipos construídos socialmente em torno da figura feminina. Com o avanço da ciência, a medicina começou a criar diversas teorias, que inicialmente tinham caráter científico, mas que depois foram consideradas como pseudociências. “Um exemplo são os pensamentos eugenistas, que acreditavam que a biologia da mulher era inferior, pois tinha um cérebro e por isso elas não podiam estar em locais de grande relevância social, já que eram consideradas menos inteligentes e facilmente afetadas emocionalmente”, completou.
A docente contou que o discurso bíblico, advindo da ascensão do cristianismo, também contribuiu para a propagação dessas ideias: “As narrativas bíblicas que colocam Eva como alguém que comeu uma maçã envenenada que a expulsou do paraíso, dá a entender que a figura feminina não consegue lidar com o desejo e com as emoções”. Ela acrescentou que essas narrativas propagam a ideia de que elas não seriam capazes de realizar atividades que exigiam mais responsabilidade, pois esses ambientes seriam mais hostis e demandaria uma racionalidade que, supostamente, as mulheres não possuíam.
No período entre guerras, houve grande destaque da participação feminina na área da saúde, especialmente na enfermagem. Durante a Segunda Guerra Mundial, houve uma grande falta de mão de obra nas fábricas e indústrias, pois parte da população masculina estava atuando na guerra. Dessa forma, as mulheres passaram a ocupar várias funções, em ambientes como as indústrias bélica e automobilística, mas, com o fim do conflito, elas precisaram voltar ao seu “lugar” socialmente definido. “É nesse contexto, na década de 60 e 70, que começa a 2º onda do feminismo, na qual muitas feministas da época questionam os valores tradicionais”, explicou Guerin.
Uma das conquistas desse movimento foi a aprovação da Lei 4.121 de 27 de agosto de 1962, o Estatuto da Mulher Casada, que alterou diversos pontos do Código Civil. Até esse ano, se as mulheres quisessem trabalhar, gerenciar bens ou até mesmo firmar contratos, elas deveriam primeiramente pedir autorização de seus maridos. “Isso é reflexo da condição da mulher naquele período histórico, as mulheres, especialmente as casadas, não tinham autonomia civil”, afirmou a professora.
Com a evolução das lutas feministas, os pensamentos estruturalmente instaurados na sociedade, acerca do papel das mulheres, foram sendo reformulados e a participação desse grupo em específico se alterou, porém, os resquícios dos estereótipos ainda se perpetuam no cenário contemporâneo. A profissional da educação esclarece: “Por mais que as mulheres estejam ocupando mais espaço no mercado de trabalho atual, como, por exemplo, na medicina, elas têm maior presença em áreas que demandam habilidades associadas ao gênero feminino, como pediatria, dermatologia e ginecologia”.
Subparticipação feminina na tecnologia
Atualmente, as mulheres representam cerca de 50% da população mundial, de acordo com o Relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) elaborado no ano de 2022, e mesmo assim são impedidas de ocupar posições de destaque e ainda são vítimas de um processo de apagamento, principalmente, quando o assunto são as profissões vinculadas ao ramo tecnológico.
No Brasil, os números não são muito diferentes do cenário global. O Censo Demográfico de 2022 levantou que as mulheres fazem parte de 51,5% da população, entretanto, ocupam somente 39% dos empregos no setor da Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC). Segundo Leandra, a área tecnológica carece de mulheres em seus setores, do mesmo modo que ocorre em áreas mais prestigiadas socialmente, dentre elas, engenharia e medicina, devido à presença de estereótipos de gênero. Ela ainda afirmou que, “apesar de algumas empresas de tecnologia, como a Microsoft e a IBM, terem iniciativas para promover a contratação de mulheres, elas ainda não têm sido suficientes para efetivar, de fato, uma inclusão na atuação nessas áreas”.
Essa aparente exclusão e o esquecimento são percebidos ao analisar o contexto histórico referente às inovações tecnológicas. Diversas mulheres contribuíram com participações importantes na criação e desenvolvimento de projetos que permitiram avanços na tecnologia, mas os nomes que são midiatizados e colocados em foco são os dos homens, o que influencia na percepção pública sobre quem ocupa predominantemente esses espaços.
Na mídia, há uma ampla divulgação de figuras como Bill Gates e Steve Jobs, os quais desempenharam papéis de importância na evolução de diversos âmbitos tecnológicos, mas outras personalidades, que também deveriam ter uma notoriedade, devido às suas contribuições nesse ramo, têm suas histórias e feitos esquecidos. Em sua maioria, tais personagens históricas, as quais têm suas histórias separadas do progresso da tecnologia, são mulheres.
Nomes como o da matemática Ada Lovelace e da inventora Hedy Lamarr não são lembrados quando se discute sobre softwares e hardwares, mesmo que ambas tenham contribuído para o desenvolvimento inicial de tecnologias que são utilizadas até os dias de hoje, como a primeira idealização de um software e as bases para a criação do WiFi e Bluetooth.
A presença feminina, na maioria das vezes, é lembrada pelas próprias mulheres, que vão contra a estrutura que prioriza o destaque aos homens, e se apropriam de outras personalidades que possam servir de inspirações para seguir em suas carreiras. Maria Eduarda Silva Ferreira, de 19 anos, é graduanda do curso de Sistemas de Informação (SI) e atua como profissional em Infraestrutura de Redes, contou que desde criança apresentava interesse pela área da tecnologia, e apontou como principal incentivadora a criadora Rafaella Ballerini. “Lembro que decidi seguir o caminho da tecnologia enquanto assistia a um vídeo dela sobre desenvolvimento, apesar de eu não ter seguido a área de programação, ela foi uma grande inspiração.”
No contexto atual, para além do esquecimento, a atuação das mulheres no mundo tecnológico também apresenta uma porcentagem inferior quando comparada com a masculina. Segundo dados de estatística de gênero do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 13,3% dos estudantes de Computação e Tecnologia da Informação e Comunicação são mulheres. Quando se analisa o cenário da própria Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em pesquisa realizada pelo Centro de Estudos, Pesquisas e Projetos Econômico-Sociais da Universidade Federal de Uberlândia (CEPES/UFU), no ano de 2021, foi possível notar uma sub-participação de mulheres nos cursos de graduação em Ciência da Computação (BCC) e Sistemas de Informação (BSI) (tabela). A partir do levantamento, a participação feminina no primeiro representa cerca de 10,88% e no segundo equivale a 13,01%.

Dados referentes a pesquisa realizada pelo CEPES/UFU no ano de 2021
Outro dado que explicita a diferença na quantidade de mulheres e homens atuando em áreas tecnológicas é referente ao número de professoras lecionando na FACOM/UFU. Dos 51 professores atuantes no Campus Santa Mônica, sete são mulheres. Segundo a socióloga Leandra, esse valor pode ser analisado por meio de uma observação histórica e cultural: “À medida que pensamos nos níveis de educação mais amplo, de mais prestígio social, as mulheres têm menor presença, como por exemplo, nas universidades, como professoras universitárias. Entretanto, nas escolas primárias, a ideia da mulher como uma figura maternal faz com que esse espaço seja relacionado a um campo de atuação delas.”
O número de evasão referente à participação das mulheres nos cursos ligados a área de Tecnologia da Informação (TI) demonstra um agravante quanto à possível inserção dessas profissionais no mercado de trabalho tecnológico. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, há uma taxa de 79% de desistência logo no primeiro ano de curso.
Sara Cristina dos Santos, 19 anos, faz parte desses números. Atualmente, é estudante de Ciências Contábeis na UFU, mas, anteriormente tinha se dedicado a um interesse que começou ainda mais jovem, no ensino médio, a programação. A partir de sua apreciação por computadores, tecnologia e jogos digitais, influenciada, principalmente, pela mãe, a jovem demonstrou uma vontade de seguir nessa carreira, mas logo foi deixada de lado ao pensar nas possibilidades oferecidas para as mulheres no mercado de trabalho.
“Eu deixei a programação de lado porque eu achei que a contabilidade ia ser uma opção melhor, levando em conta que meu pai é dono de uma empresa de contabilidade, eu gosto de pensar nisso como um hobby agora", disse Sara Cristina.
Assim como a estudante de Ciências Contábeis, a graduanda de SI, Maria Eduarda, contou que o interesse pela tecnologia, que iniciou quando era muito nova, foi incentivado pela família, o que permitiu que a escolha de sua profissão partisse somente dela, independentemente de ser uma profissão mais “masculinizada”, o que resultou na sua permanência nesta área. A jovem, porém, acrescentou: “Infelizmente, sei que muitas meninas não são apoiadas, mas espero que elas desde crianças sejam incentivadas a seguirem carreiras comumente masculinas e que o mercado de trabalho continue sendo mais inclusivo, ultimamente estão criando muitas cotas para mulheres nos processos seletivos de tecnologia e isso é um baita incentivo para quem nunca teve nenhum.”
No mercado de trabalho, a posição feminina também é discrepante, correspondendo a cerca de 39% das vagas no setor tecnológico, enquanto o público masculino ocupa, aproximadamente, 61% dos trabalhos nesta área. Segundo a socióloga Leandra Guerin, há diversos fatores que contribuem com essa narrativa hierárquica dos homens nas profissões que exigem qualificação técnica, alguns pontos como o contexto histórico e as desigualdades que permeiam a participação das mulheres na esfera profissional ajudam a perpetuar esse gráfico desigual. A professora afirmou ainda que, mesmo com a existência de amparos legais no objetivo de igualar a presença feminina, como o artigo 5° inciso I da Constituição Federal de 1988, o qual busca surtir efeitos não somente no mundo do trabalho, mas em outros setores da vida cotidiana, eles não têm sido suficientes para suprir tal disparidade.

Dados a partir do Censo Demográfico de 2022
Leandra explicou ainda que a condição biológica que confere a esse público a possibilidade de engravidar, há uma lógica estereotipada com relação à maneira como as mulheres executarão suas profissões: “se pretendem ter filhos, elas vão sair de licença, ou elas vão faltar mais no trabalho para dar assistência aos seus filhos, ou até mesmo questões como TPM, tensão pré-menstrual, tudo isso, supostamente, impactaria na produtividade das mulheres.” Esses fatores implicam uma baixa na contratação feminina e, também, na desvalorização salarial.
De acordo com outra entrevistada, a qual já está consolidada na área tecnológica e preferiu não ter seu nome revelado, por isso será tratada pelo pseudônimo Clara, essa situação desigual se confirma, igualmente, em suas próprias experiências vivenciadas no contexto de trabalho. Algumas das circunstâncias já presenciadas por ela se apresentam da seguinte forma: “como por exemplo um colega de trabalho ter que reafirmar o que eu já tinha dito para alguém, pois a minha palavra não tinha sido o suficiente ou até mesmo eu ouvir em um processo seletivo que ‘o nosso time é composto só por homens, mas pode ficar tranquila que eles não se importam em trabalhar com uma mulher’.” A profissional completou ainda com o seguinte questionamento: "Será que se eu fosse um homem isso estaria acontecendo?".
“Queriam me ‘conhecer melhor fora do trabalho’” - Clara
Outro fator que, segundo a socióloga Leandra Guerin, é tolerado e minimizado na área tecnológica, é o assédio contra os indivíduos do gênero feminino. Nos eventos pertencentes à cultura geek e no âmbito tecnológico como um todo, é muito comum a naturalização de ações vexatórias que causam constrangimento, principalmente, às mulheres. No ambiente profissional, há diversos casos de assédio moral, no qual, conforme pesquisa realizada pela médica Margarida Barreto, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a classe feminina representa 65% das vítimas desse crime. Com relação ao assédio sexual, a porcentagem tem um aumento notório, 79,9%; o levantamento aponta ainda que a maioria dos atos é praticada por aqueles que apresentam cargo mais alto dentro da hierarquia empresarial, normalmente, pelos chefes ou colegas de trabalho.
“Nunca chegou a acontecer algo tão direto, mas já chegaram a pedir minhas redes sociais pelo Teams pois queriam me ‘conhecer melhor fora do trabalho’”, afirmou Clara ao ser questionada sobre possíveis situações de assédio em seu cenário de atuação.
A profissional contou ainda que, por estar em um ambiente consolidado com a presença masculina em grande escala e ser a única mulher presente, o sentimento de desvalorização acaba por tomar conta e encontra lugar justamente na sensação de inferioridade: “Às vezes surgem pensamentos intrusivos, e me questiono se realmente mereço estar naquele espaço.”
Soluções inovadoras: #include<girls> e outros projetos
Diante da problemática apresentada, existem algumas soluções criadas em prol de minimizar a disparidade relacionada a participação das mulheres no mercado de trabalho tecnológico, como o Programa Asas para o Futuro, uma iniciativa do Ministério das Mulheres, que irá trabalhar com intuito de promover capacitações e formações de jovens garotas de 15 a 29 anos, em específico negras, indígenas e periféricas. O projeto contará com investimentos de R$ 10 milhões, e é previsto que cerca de 20 mil mulheres sejam beneficiadas por ele ao ano.
Entre outras atividades, encontra-se a comunidade “WoMakersCode”, “Fundada em 2015, para mostrar que tecnologia é, sim, lugar de mulher”, como é dito no site, é amplamente reconhecida no panorama da América Latina e atua em parceria com o “Pacto Global da ONU”. A iniciativa busca incluir esse público nos setores da tecnologia, por meio de workshops, programas de formação, materiais e orientações de carreira.
Ou a iniciativa “{reprograma}”, uma organização de impacto social fundada em 2016 que tem como objetivo ensinar programação para o público feminino, com foco em mulheres negras, trans e travestis. A partir de de cursos online, já impactou mais de 4 mil cidadãs, por meio do ensino de Javascript, Back End, Python, Front End e Educa{Devas}.
Além dessas soluções, há projetos como o “{elas} programam_”, “PrograMaria”, “Mulheres na Computação”, “Rails Girls”, “PyLadies”, que também trabalham para reduzir os efeitos da evasão nos cursos de ensino superior relacionados à área da computação e tecnologia, assim como o “#include<girls>”, desenvolvido na UFU, que atua em parceria com o programa “Meninas Digitais”, chancelado pela Sociedade Brasileira de Computação (SBC). Este trabalho é especialmente voltado, em consonância com a professora Fabíola Souza, para a promoção de atividades que incentivem o ingresso e permanência de meninas do ensino médio público de Uberlândia e região nos cursos relacionados a Computação e Tecnologia da Informação. Além de fomentar discussões a respeito das áreas de atuação, desafios e oportunidades para as mulheres nesse meio, oferece apoio às próprias discentes das respectivas graduações por meio de monitorias e tutorias.
Segundo o livro “Fahrenheit 451”, de Ray Bradbury, todos devem deixar algo para trás quando morrem, algo que sua mão tenha tocado de algum modo, para que sua alma tenha para onde ir quando você se for e que, quando as pessoas olharem para aquilo, saibam que você estará ali. A professora Gina Maira Barbosa de Oliveira, docente da FACOM/UFU, cujo falecimento ocorreu na última segunda (04), criou e transformou coisas por meio de seu toque e sabedoria. Idealizadora do “#include<girls>”, a professora foi quem reuniu as docentes da FACOM para que fosse possível a criação do projeto.
A escolha do nome se deu a partir de um concurso entre as alunas de graduação em CC e SI da universidade. Conforme o “Relato de experiência da criação do grupo #include<girls>: onde estamos agora e o que vem a seguir”, foram recebidas 11 propostas, dessas, cinco foram eleitas as melhores e encaminhadas para votação pela comunidade discente e docente da instituição de ensino superior.
O projeto teve inauguração e nomenclatura definidas no dia 12 de outubro do ano de 2021, a data não foi escolhida por acaso, ela simboliza uma homenagem à primeira programadora da história, a matemática Ada Lovelace, que representou uma conquista ao público feminino, ao ser a pioneira em uma área a qual é ocupada, predominantemente, por homens. A divulgação ocorreu durante a primeira edição do “Meninas na Computação”, dentro da programação da semana acadêmica da FACOM/UFU, as dinâmicas e apresentações de painéis foram realizadas em modo online, devido ao contexto da pandemia de COVID-19, que estava sendo vivenciado por toda a população.
Além de encontros e trabalhos para propiciar o conhecimento tecnológico às mulheres, o grupo também propõe, em seu site #include<girls>, o compartilhamento de suas realizações, seus integrantes e futuras atividades que serão desenvolvidas pelo grupo. Na plataforma é possível ver os registros das participações em eventos, como o “Vem pra UFU” de 2024, momento que teve como objetivo apresentar a instituição para a comunidade externa ao mostrar os projetos que são desenvolvidos em cada curso e, assim, instigar os alunos a escolherem a UFU para traçar o seu caminho no mundo acadêmico.

O projeto, atualmente, possui cerca de 15 estudantes, dentre eles bolsistas e voluntários | Fonte: Site Oficial
Uma das dinâmicas registradas no evento “Meninas na Computação” foi o painel com mulheres que atuam na Computação, desenvolvido de maneira remota. O momento reuniu cerca de 268 participantes, incluindo discentes da universidade e da comunidade externa. Foram convidadas a professora Mirella M. Moro da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a consultora Geovana Cardoso, da Algar Telecom, e Jhúlia Graziella Rodrigues, engenheira de software da Google, o debate contou com mediação da professora Gina, da FACOM/UFU. O evento, com duração de uma hora e meia, foi iniciado com uma discussão inicial sobre três temas propostos pela organização e, ao final, responderam às perguntas feitas pelos ouvintes, as quais foram enviadas em transmissão no YouTube. Elas contaram um pouco de sua história com a área da tecnologia, assim como falaram sobre suas trajetórias profissionais.
Os relatos das experiências individuais e as dicas dadas pelas convidadas despertaram o interesse dos participantes que responderam a um questionário de avaliação, em que puderam compartilhar suas experiências sobre o evento, o resultado se demonstrou positivo. A participação delas foi finalizada com dicas para meninas que desejam seguir carreira na área. De acordo com a professora Mirella, a minoria feminina presente nesses cursos configura um diferencial afirmativo, pois faz com que adquiram resiliência durante a graduação, e saiam preparadas para enfrentar a sociedade que ainda reproduz ideias machistas.
Outra atividade executada pelo projeto foi o ensino de programação básica para jovens meninas do ensino médio de escolas públicas da cidade de Uberlândia, como a Escola Estadual Professor José Ignácio de Sousa. Para facilitar o ensino, o jogo Minecraft: Viagem Aquática, desenvolvido pela organização Code.org2, foi selecionado. O jogo permite uma desmistificação de determinados estereótipos relacionados à área tecnológica, como a definição de que é muito difícil coisas relacionadas à tecnologia ou que poucas pessoas conseguem programar. Assim, a aula foi feita a partir da linguagem Blockly de programação visual, baseada nas ações de arrastar e soltar blocos de código no jogo.
O minicurso foi realizado de maneira remota e foi ministrado, durante 1 hora e meia, por alunas integrantes do Programa de Educação Tutorial (PET) do curso de Computação da UFU. A atividade reuniu metade do público esperado com base nas inscrições, que era de 34 participantes, isso se deu a partir da inviabilização da comunicação entre as inscritas e o projeto, devido a falta de telefone em suas casas. O receio de que fosse cobrado um valor pelas aulas e a falta de um equipamento para a realização das atividades do minicurso também impactaram na participação dessas jovens.
O evento foi iniciado com uma recepção às alunas e uma breve apresentação sobre os cursos de tecnologia da instituição, além de um momento de debate sobre a presença feminina na tecnologia. Foi um momento de aprendizagem sobre as etapas iniciais da programação, em que as garotas desenvolveram pequenos códigos e ampliaram o interesse na área. A atividade ainda resultou no sorteio de um prêmio que foi fornecido por uma empresa da região uberlandense.
O projeto visa manter contato com as escolas em que foi possível se conectar com as meninas que participaram do minicurso e assim oferecer novas atividades para elas e para outras estudantes. Além disso, novas formas de divulgação e adequação de um ambiente laboratorial fazem parte do objetivo, para que as aulas sejam ministradas de maneira presencial e que o problema da falta de equipamentos não seja um empecilho para que mais garotas tenham acesso a um ensinamento que contribuirá com sua vida acadêmica e profissional.
Desde o desenvolvimento inicial, o “#include<girls>”, que possui cerca de 729 seguidores em seu perfil do Instagram, opera até os dias atuais, por intermédio de atividades de extensão, ensino e pesquisa. Algumas dessas ações marcaram presença por meio de quatro edições do evento “Meninas na Computação”, pelos programas extensionistas: “SIEX 26896 - Introdução ao Pensamento Computacional para Meninas do Ensino Médio" e "Pensamento Computacional para Alunas do Ensino Médio de Escola Pública" e "SIEX 27430 – #include<girls> nas mídias digitais: fomentando a participação de meninas em TI por meio de conteúdo para mídias digitais". Além da implementação de um projeto de ensino e dois envolvendo pesquisa, respectivamente: "Incluindo Meninas na Computação: mentoria e rede de apoio para alunas da graduação", "Método de Ensino de Programação para Estudantes do Ensino Médio de Escolas Públicas com Igualdade de Gênero" e "Desenvolvimento de um método para potencializar os estudos de programação competitiva no ensino médio e fundamental".
Em 2021, ano de elaboração do relato de experiência, foram elaboradas algumas possibilidades de direcionamentos futuros do “#include<girls>”. Dentre elas, encontram-se: realização de monitorias e tutorias, as quais permitam que as alunas tenham contato direto com as professoras da graduação já nos primeiros períodos; divulgação de ações e comunicação nas redes sociais, tendo como objetivo proporcionar visibilidade ao grupo, para que atinja o maior número de meninas da região; e fomentar o ingresso de meninas no ensino superior nas áreas de Computação e TIC, por meio da ação em escolas de nível médio e do desenvolvimento de minicursos semestrais.
Segundo a professora Fabíola, a iniciativa tem sua relevância baseada no aumento da representatividade de mulheres nos cursos da FACOM/UFU, que aumentará a diversidade no âmbito profissional, “característica essencial para a evolução da Faculdade de Computação, do ponto de vista de formação de recursos humanos para a sociedade”, completou a docente. Além disso, contribui para o sentimento de identificação, legitimação e pertencimento no ramo da tecnologia.
Ana Bárbara Campos Conti, 22 anos, é graduanda de Ciências da Computação, relatou fazer parte da iniciativa há dois anos e contou que tomou conhecimento do “#include<girls>” pelas redes sociais do grupo. A estudante afirmou: “O projeto contribuiu para a minha vida de inúmeras formas, antes dele estava aflita, com medo, sem saber qual área seguir e com muita dificuldade nesse mundo principalmente por ser uma das poucas mulheres imersas nele”. O relato de Ana Bárbara demonstra como a presença feminina no ramo tecnológico ainda está atrelada a um sentimento de não pertencimento, justamente por não encontrar outras figuras femininas na própria faculdade para as quais olhar e se inspirar. Esse direcionamento poderia vir das professoras, mas devido à quantidade reduzida de docentes do gênero feminino, os estudantes dos cursos de tecnologia da UFU acabam tendo pouco ou nenhum contato com elas em salas de aula até metade da graduação.
Ana completou ainda como o projeto contribuiu para as decisões sobre sua carreira e como ajudou na proximidade com outras mulheres do setor tecnológico. “Por meio dele, me encontrei na área que queria atuar, descobri minha paixão por educação e hoje continuo trabalhando ensinando o pensamento computacional, além disso me ajudou a desenvolver amizades com meninas incríveis, fazer network com mulheres do ramo e a desenvolver soft skills importantes para o mercado”, afirmou a estudante de Ciências da Computação.
Outra participante do projeto é Amanda Estrela dos Santos, de 20 anos, estudante do curso de Sistemas da Informação, que o descobriu por meio de uma reunião de divulgação de atividades de extensão envolvendo a graduação de SI e mencionou que já faz parte dele há um ano. Amanda pontuou: “O projeto tem sido essencial para minha formação. Além de aprimorar minhas habilidades, como falar em público e transmitir conhecimentos, ampliou minha visão sobre a importância da inclusão feminina na área de tecnologia”.

O evento “Meninas da computação” foi realizado em parceria com a FACOM TechWeek | Foto: Arquivo pessoal de Amanda Estrela dos Santos
A graduanda disse ainda que enxerga nessa iniciativa uma chance única de promover o empoderamento das mulheres no ramo tecnológico, ao impulsionar a igualdade de oportunidades tanto nos estudos quanto no mercado de trabalho, por meio do ensino de programação. Além de vivenciar uma experiência transformadora ao se envolver com uma iniciativa muito relevante, que busca a ampliação da participação feminina na educação e nas profissões tecnológicas.
Além das mulheres citadas no texto, quais outras personalidades femininas têm um espaço guardado na sua memória quando o assunto é o mundo da tecnologia? Deixe nos comentários para que mais pessoas possam conhecer também e se não tiver nenhuma, talvez seja o momento de descobrir algumas delas.



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